Definitivamente quem afirma que vivemos um período de crise criativa na música nacional é porque não conhece o que está sendo produzido nos rincões de produção musical, pátria amada Brasil. Os custos de produção, a possibilidade de se gravar bem com pouco, a internet, o maior intercâmbio e troca de informações, têm criado uma geração de novos artistas. O que falar sobre a diversidade musical então? É impressionante. Qualidade e quantidade.
Em nossa lista você vai encontrar artista com pedigree de artista, e mais próxima ao meio, como Alice. Vai encontrar também bandas gloriosas, que já rodam há alguns anos no cenário independente, totalmente desprovidos de brasilidade, sem samba no pé, pele branca como o céu nebuloso, céu de uma manhã curitibana, como o ruído/mm. O brega nacional dos anos 80, romântico e sintetizado está de volta sem dó, sem medo de ser feliz e rir de si mesmo, caso do Séculos Apaixonados. O hip hop nacional já saiu das periferias e emplaca três discos em uma lista de indie. Emplaca em qualquer lista, poderia e deveria emplacar mais. A capacidade de provocar através das palavras, a habilidade em se renovar e explorar novos terrenos em termos de melodia e até mesmo gênero, flertando através dos gêneros, dialogando assim com um novo público, o céu é o limite. A psicodelia goiana e até de uns gaúchos já bem conhecidos. Gente grande e gente nova, numerosas e pequenas plateias, temos de tudo. A única homogeneidade dessa lista é o fato de todos os discos serem bons. Pode ouvir sem medo de errar. O seu próximo disco favorito deve estar nessa lista. Vida longa a nossa música, que se encontra em uma fase sem paralelos de profusão artística. Parabéns aos listados. Não foi fácil fechar essa turma, outros bons ficaram de fora. Assim segue a vida.
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25. Muñoz – Nebula
Uma banda que caiu despretensiosamente na playlist e já no primeiro riff deu uma martelada na têmpora. Esse duo, bateria e guitarra, consegue dar uma dose de êxtase e alegria pra quem gosta de música de peso. Nebula enche de expectativa as pessoas que ainda confiam que o stoner rock brasileiro não morreu.
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24. Cachorro Grande – Costa do Marfim
Roendo outros ossos, agora a banda surpreendeu com um trabalho bem diferente do que costumava fazer. Com uma vibe psicodélica, a Cachorro Grande solta latidos psicodélicos em uma direção totalmente oposta graças a ajuda do conceituado Edu K. As claras referências ao Primal Scream, Bowie da era Eno, Kula Shaker e Kasabian dão as caras nesse disco. Em entrevista para a 505, Beto Bruno também citou as programações do disco “Standing on the Shoulder of Giants” do Oasis. Com um conceito bem definido, esse álbum necessita de todo um ritual para você se ligar. E como disse o próprio vocalista: “Esse disco é pra galera se chapar”. Destaque para as faixas: “Nós Vamos Fazer Você se Ligar”; “Nuvens de Fumaça”; “Use o Assento para Flutuar” e “Torpor Partes 2 & 5”.
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23. Huey – Ace
Instrumental stoner classe A. O melhor e mais bem produzido que encontramos ao longo do ano no gênero. Pedrada atrás de pedrada, tapa na orelha.
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22. Séculos Apaixonados – Roupa Linda, Figura Fantasmagórica
Assim como o Future Islands entre os internacionais, a carioca Séculos Apaixonados fez a melhor música do ano dentro de território nacional, “Refletir é Inútil”. Desnecessário dizer que o resto do disco não segura todo esse vigor (senão ficaria logicamente em primeiro), mas nem por isso é ruim. Só não é fora de série. É louvável o atrevimento da banda em encarar uma estética que estava largada no canto, empoeirada, na garagem da bagunça lá na casa da vó, e lavar, polir, passar um cromadão, trocar as rodas e molhar as engrenagens com o óleo do amor. Discão, mais do que bem-vindo, tendendo para o romântico, deveria ser um abre-alas para novos rumos no pop rock nacional, junto com Carne Doce e alguns outros dessa lista.
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21. Far From Alaska – modeHuman
A banda lançou esse ano seu primeiro álbum completo, modeHuman. Disco forte, com muita pegada. Os sintetizadores dão um toque especial entre os riffs e a bateria descansa pouco nesse disco.
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20. Thiago Pethit – Rock’n’Roll Sugar Darling
Rock´n´roll sugar darling é o melhor disco do cantor. Com um repertório noir e bem underground. Uma grande surpresa.
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19. Celso Sim – Tremor Essencial
Ótimo disco do paulista Celso Sim, principalmente porque trás “A liberdade é Bonita”, uma das músicas mais essenciais atualmente. E destaque também para “Tupitech”, com versos do Xico Sá.
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18. Constantina – Pelicano
Mais um puta álbum de rock instrumental foda. A leveza da melodia do teclado se contrasta com o arranjo de riffs pesados e a bateria marcada. Você pode escutar esse álbum em looping eterno sem perceber.
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17. Criolo – Convoque seu Buda
O Criolo de Convoque seu Buda está muito mais próximo do Criolo de Ainda há Tempo do que o de Nó na Orelha nas suas letras. Quanto a contextualização artística, ainda tem umas rebarbas de fácil assimilação com o de 2011, onde achou a fórmula de sair do hip hop underground e passou a ser hip hop gourmet, levando a experiência que teve nas ruas para a classe média-alta, que é o mais perto que vão chegar da realidade do “mundão”. Quem conheceu o Criolo Doido, rebento do Sabotage, de beats pesados, flow assimétrico e marrento, só o enxerga em “Duas de Cinco”, lançada anteriormente ao álbum e em “Plano de Voo”, com a participação do Neto, do Síntese. Não estou dizendo que é errado, que não é bom, ou que não seja merecedor de seu sucesso. Não é isso. O fato é que menino Kleber não é mais o mesmo para aqueles que o escutaram em fita k7 doada e pode ser que em breve não seja mais o mesmo pra quem ainda vai escutá-lo em vinil, com valor de disco gringo.
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16. Adriano Cintra – Animal
Os dois primeiros discos do CSS, o Madrid, as produções, Adriano Cintra sempre fez coisa bacana. Agora a preocupação parece mais em fazer músicas pop, em uma levada mais frenética que Madrid e menos do que CSS, sem a necessidade de causar. As letras são incipientes, inofensivas, a melodia e os sintetizadores são os propulsores dessa engrenagem. Precisamos dançar, mas sem perder a compostura jamais.
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15. Assopro – Assopro
Rock instrumental daqueles que te levam pra outra dimensão. Cheias de sintetizadores, guitarras volumosas e percussão com influência de samba, as faixas desse álbum são carregadas de sensações.
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14. Pipo Pegoraro – Mergulhar, Mergulhei
Talento e sentimentos definem esse álbum. Com arranjos encorpados que nos faz lembrar de Milton Nascimento, Flávio Venturini e Lô Borges, Pegoraro oferece sua voz aos instrumentos que compõem seu trabalho.
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13. Luziluzia – Come on Feel the Riverbreeze
Em muitos aspectos esse é o meu disco favorito de 2014. Sem se obrigar às brasilidades, esse tipo de amarra que é quase uma cartilha (ou armadilha) sagrada de bandas brasileiras, o Luziluzia consegue entregar um álbum world class, no gênero que ataca e que convenientemente preferimos chamar de rock alternativo. “Monólogo do velho louco” é a melhor canção de um disco sem canção ruim, poderia destacar também as ótimas dinâmicas de excitação e melancolia em“Polinésia” e “Cosmic Melodrama“, a força pop/radiofônica de “Existir“. O petardo de “Alegria”. Ou as faixas de transição para uma realidade alterada, como “Torpe” e “52Hz“.
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12. Alice Caymmi – Rainha dos Raios
Longe do sobrenome, mas com a voz de um Caymmi, Alice traça a própria música. O segundo disco da cantora é absolutamente superior ao primeiro. Trabalho muito inteligente, revigorante, ousado e audacioso, coloca Rainha dos Raios como dos melhores discos deste ano. Destaque para “Iansã”, música de Caetano e Gil.
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11. Câmera – Mountain Tops
Disco lindo cheio de amores e humores. O desenrolar das melodias ganha movimento progressivamente passando uma sensação de movimento brando. Música sossegadamente desenvolvida, mas sem perder a ternura jamais dos grunhidos de guitarra da escola Sonic Youth. Talvez um meio de campo entre o Grizzly Bear, o Yo La Tengo e o Mogwai seja a melhor definição.
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10. Carne Doce – Carne Doce
Com bela poesia e temas sortidos, o Carne Doce reúne nas letras a sua primeira grande força. Musicalmente rico com alternativas e dinâmicas variadas. As composições passeiam por influências diversas, a banda diametralmente empresta referências da MPB brasileira setentista, alguma coisa do pop rock nacional das décadas seguintes, e uma dose boa de seus conterrâneos do psicodelismo goiano. Os arranjos são sensacionais, tudo foi muito bem costurado por aqui. A interpretação vocal é um oásis na busca por novidades sonoras. Se de fato será, não posso afirmar, sabendo como as coisas acontecem por aqui, é mais provável que continue longe das massas. Mas, não tenho dúvidas que esse disco do Carne Doce é o que deveria ser visto e ouvido como definidor de novas frentes no pop rock nacional. Criativo, visceral, poético e talentoso, dialoga essencialmente dentro de um universo particular, e esse universo particular é linguagem popular.
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09. Ceumar – Silencia
O melhor trabalho da cantora mineira, Silencia, é de um primoroso trabalho, desenhado para o violão da cantora e o violoncelo de Vincent Ségal. Há alguns anos morando na Holanda, a melodia de Ceumar mudou com este trabalho. Em alguns momentos me fez lembrar muito Sigur Rós. A voz de Ceumar é límpida, corrente, necessária. Quase nenhuma cantora atualmente consegue alcançar este patamar. Duas das melhores músicas nacionais estão neste disco: “Engasga gato” e “Encantos de Sereia” (que na primeira audição já coloquei como uma das mais bonitas melodias da MPB).
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08. Racionais Mc’s – Cores e Valores
É um bom disco sim! O lançamento do disco, o retorno do grupo e o que eles tem a dizer falam por si só. Mais legal ainda é ver que a irreverência e a acidez característica do Racionais, usada pra falar sobre o sistema ou o que acontece no cotidiano das periferias não precisa ser rimada ou ter a mesma duração de Faroeste Caboclo. Quem comprou a ideia do álbum pela capa, achando que teria a mesma sensação que teve com o Nada Como Um Dia Após O Outro, definitivamente comprou o álbum errado.
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07. Russo Passapusso – Paraíso da Miragem
É o álbum do verão! Cheio de brasilidade, Paraíso da Miragem é fresco e de uma diversidade rítmica absurda. Produzido por Curumin (onde claramente se ouve a influência do artista no trabalho de Russo), Zé Nigro e Lucas Martins, ainda conta com participações de Anelis Assumpção, Bnegão, Marcelo Jenecí e Edgard Scandurra. Encantador do começo ao fim.
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06. Elo da Corrente – Cruz
Cada beat de cada faixa tem personalidade. Com influência de afrobeat brasileiro e jazz, e participações especialíssimas de Danilo Caymmi, Márcia Castro e Rodrigo Brandão. Cruz é harmonioso, melódico e cheio de elegância. Eleito o melhor álbum de hip-hop de 2014 pelo iTunes e também por esta humilde publicação.
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05. Nação Zumbi – Nação Zumbi
O mais legal desse álbum é ver que o manguebeat se modificou sem perder a essência depois de 7 anos de hiato entre os dois últimos discos do Nação Zumbi. Transita entre ritmos com delicadeza. Soul e groove se encaixam com o maracatu de Jorge du Peixe.
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04. Titãs – Nheengatu
Vindo de uma fase discográfica péssima, era difícil acreditar que os Titãs iriam surpreender com o novo álbum. Mas parece que a recente turnê em comemoração dos 30 anos do clássico álbum Cabeça Dinossauro reviveu o rock titanesco. Um pouco mais próximo da fase mais suja, como Titanomaquia e Tudo ao Mesmo Tempo Agora, a banda trouxe canções geralmente curtas e diretas, sempre com críticas ácidas em suas letras. O interessante, também, são as colaborações nas composições com grandes nomes brasileiros, como o humorista Angeli (em “República dos Bananas”) e o ex-titã Arnaldo Antunes (em “Cadáver Sobre Cadáver”). Uma bela volta dos dinossauros brasileiros. Destaque para as faixas: “Fala, Renata” , “Cadáver Sobre Cadáver”, “Pedofilia” e “Flores Para Ela“.
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03. ruído/mm – Rasura
O disco mais polido do ruído até o momento, e aqui falamos de uma banda que sempre criou em alto nível. Dentro de um gênero musical pouco popular, justamente por se afastar das convenções da música pop, o grupo curitibano soube distribuir peso, melodia, climas, sensorialismo, o disco derrama emoção através de uma intrincada e formidavelmente bem arranjada fórmula instrumental, ao longo dos seus mais de 45 minutos. É nítido notar como eles ganharam cancha com o decorrer dos anos, a diversidade, as possibilidades e o universo em que trabalham tem se expandido progressivamente.
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02. Juçara Marçal – Encarnado
Disco pautado na guitarra. Poesia pautada na guitarra. Uma ode ao que de melhor a música brasileira é capaz de produzir. Longe da MPB tradicional, Encarnado é um disco lindo, impecável do começo ao fim, para se escutar tomando uma cerveja, sozinho, para prestar atenção em todos os detalhes. O sangue brota da voz de Juçara.
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01. Anelis Assumpção – Anelis Assumpção e Os Amigos Imaginários
Quem herda não rouba. O talento da filha mais velha do mestre Itamar Assumpção se mostra ainda mais presente no álbum Anelis Assumpção e Os Amigos Imaginários. Lançado no final de agosto desse ano, com influencias de rap, dub, reggae, afrobeat, samba, bossa nova, eletrobass, frevo , cumbia e mambo, Anelis usa e abusa de toda sedução presente em sua voz, cantando e até mesmo conversando em algumas faixas do álbum, com uma transparência e nitidez sem igual. Quanto ao conteúdo das letras, explora o bom humor, fala sobre ser mulher e sobre positivismo, sem travas.Para os arremates desta obra, Anelis contou com a participação de Kiko Dinucci, Russo Passapusso, Rodrigo Campos, Céu e Thalma de Freitas. Com talento, musicalidade de sobra, Anelis Assumpção e Os Amigos Imaginários foi eleito pelo 505 Indie o melhor álbum do ano. Vida longa ao talento da moça e de seus amigos, imaginários ou não.
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Por: Flavio Testa, Lua Specian e Raphael Pousa
Colaboração: Andrey Soares e Bruno Bujes
Revisão: Carol Munhoz
Edição: Flavio Testa e Carol Munhoz
Arte: Hudson Vercelino
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