Costa Do Marfim já abre no maior estilo Õ Blesq Blom com seus gritos primais e enlouquecidos. Mas se engana quem acha que o disco será tão primitivo assim. No segundo minuto você já começa a ficar perdido, e vai ter que esperar mais um bom tempo para escutar a voz do vocalista Beto Bruno.
Para entender como foi todo o processo de criação desse divisor de ossos no estilo da Cachorro Grande, o 505 entrevistou o cachorro Beto em um bate papo que você vai seguir agora.
505: E aí Beto, como está a preparação para o lançamento do álbum (no Bar Opinião em Porto Alegre)?
Beto Bruno: Nós estamos todos cagados. Porque é difícil tocar esse disco.
505: Ninguém mandou inventar um disco doido.
BB: É bem isso aí. Ninguém mandou inventar (risos). Esse show terá umas trilhas simultâneas: overdubs de guitarra aqui, barulhinhos de teclado ali. Pra tentar ser fiel ao disco. Além disso, terá um telão sincronizado.
505: E quem está produzindo as projeções desse telão?
BB: O Charly Coombes, do Supergrass. Ele tá fazendo as projeções música por música e pra cada uma ele fez um troço diferente e muito doido. Vai ser um show mais difícil, mas acho que o público vai gostar mais.
505: Vocês vão tocar o disco na íntegra?
BB: Vamos. Menos a Torpor 2&5 que é impossível. Mas vamos tocar o disco inteiro e depois rola o revival. Não rola misturar.
505: São outros quinhentos.
BB: E as músicas dão um peso no show, por causa dos overdubs. Então vamos fazer dois shows em um. Assim como o Who quando lançou o Tommy. Eles tocavam o álbum inteiro e depois as mais antigas.
505: Além da presença do Charly Coombes, você tiveram a produção bem ativa do Edu K, o “porra louca” do DeFalla. Como foi esse processo criativo do disco?
BB: O conceito desse estilo de produção começou lá na trilogia de Berlim, quando fechou a parceria Bowie & Eno. Depois veio o Sandinista! e botou pra fudê também. Um pouco mais perto, tem o Madchester, Britpop. Um disco do Oasis que não é muito falado, mas que com o tempo vai mudar é o Standing on the Shoulder of Giants, que tem trilhas eletrônicas. O Primal Scream já fazia isso também, assim como o Kasabian. Sem falar dos discos solos do Ian Brown (vocalista do Stone Roses), muito foda nesse lado de rock psicodélico misturado com o eletrônico. Tudo isso a gente gosta muito, e o cara que nos ajudou a passar isso pro disco foi o Edu K.
505: Uma música me chama muita atenção por puxar referências como Loaded do Primal Scream, e Glass do Kasabian. É a Torpor 2 & 5.
BB: Essa eu queria que o (Paulo César) Pereio que fizesse. Mas, o Edu falou: “Entra na bocada, velho, a história é tua”.
505: As histórias são reais?
BB: Apenas duas de muitas. E foi muito inusitado essa aí ter entrado no disco. A música cresceu com os arranjos do Edu em cima das bases que eu fiz.
505: Pelo jeito ele virou um sexto integrante.
BB: O Edu é o único produtor nosso que meteu a mão nos arranjos. Junto, como um sexto integrante. Porque antes a gente se trancava no estúdio, ensaiava e saía com o disco pronto pra gravar. Foi quando o Edu ofereceu um processo Eno/Bowie: entrar no estúdio só com as bases na cabeça e criar arranjos frescos na hora. Criamos tudo ali no momento, essa é a grande diferença.
505: Por isso que as músicas estão enormes?
BB: E os solos estão bem mais chapados. O Gross não ficou escolhendo notinha por notinha. Fazia um solo e outro, ouvia qual ficava mais legal e era isso. Funcionou melhor pra nós.
505: E aquela história de vocês estarem gravando na Costa do Marfim?
BB: Isso é culpa do Rodolfo (Krieger, baixista da banda). Ele postou de brincadeira que estávamos gravando na Costa do Marfim. Até minha minha mãe me ligou preocupada. Esse papo cresceu tanto que não tinha como não batizar esse disco de Costa do Marfim.
505: Daí, que veio a ideia dessa dessa capa impactante, também?
BB: Nossas capas vêm mudando desde aquele ratão do Baixo Augusta. Chapei muito naquela capa do Cisco (Vasques). Tanto, que quis fazer mais. Esse cara (Rodrigo) que tá na capa é um artista plástico que mora com ele. Fui na casa dele e resolvemos na brincadeira fotografar o Rodrigo. Ver qual que é. E o Rodrigo é um amigão-irmão meu lá de Passo Fundo. Quando essa imagem saiu, os três sabiam que era aquilo. É icônico! E quando eu mostrei pra banda, todo mundo chapou também. Adoro capa que tú não espera.
505: Você considera o disco menos comercial da banda?
BB: Com certeza. Músicas de 10 minutos, sem refrão. É o disco que a gente mais saiu emocionado do estúdio. Nos entregamos ali. Geralmente quando você termina a gravação, tem mais aqueles 20 dias de mixagem que são pra matar. O cara não quer mais ouvir o disco. Isso acontece com todo mundo. Mas esse não, a gente saiu orgulhoso com o disco debaixo do braço. Toda casa que eu vou jantar eu levo ele pra escutar. Essa é a Cachorro Grande que a gente sempre quis ser. Porque antes a gente se preocupava em gravar o que a gente pudesse tocar nos shows. Mas agora o disco é mais importante. E é por isso que está tendo a repercussão que os outros não tiveram. Esse tá coeso, tem conceito. Essa galera da nova geração não escuta música, então a gente fez um álbum pra galera se ligar.
505: Por isso a onda indiana em Crispian Mills (faixa 5)?
BB: A cítara ali é tudo programação. O cítarista que fez algumas linhas no Cinema não pôde vir de Porto Alegre à São Paulo. Mas é o mesmo processo que o Kula Shaker fazia, por isso o nome da música. Crispian Mills é o líder da banda e sabia como levar aquele som para o palco. O que acontece com a gente agora. Acabou o preconceito que tem que tocar com “aquele amplificador”, todo mundo ao vivo no estúdio. É o que aconteceu, também, com o Clash em Sandinista!.
505: Por isso que o disco vem recebendo boas resenhas.
BB: – Que bom, esse espaço é importante para que mais pessoas escutem isso aí. Esse disco é pra galera se chapar!
Costa Do Marfim é um disco pra quem não tem pressa. Tendo um conceito bem definido, esse álbum necessita de todo um ritual para você se ligar. Abaixe as luzes, acenda a vela, abra um vinho e sinta os latidos psicodélicos da cachorrada te guiar.
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